As alterações climáticas já estão a afetar profundamente a vida das pessoas, o trabalho, a saúde e a estabilidade das comunidades. Ondas de calor, inundações, secas prolongadas e outros fenómenos extremos não só ameaçam a segurança física e alimentar, como também têm impactos significativos na saúde mental. Apesar de estas evidências estarem cada vez mais documentadas, os modelos climáticos usados para orientar políticas globais ainda ignoram grande parte destes efeitos sobre o bem-estar humano (Schrijver et al., 2025). Ao ignorar estas dimensões, os modelos subestimam os benefícios da ação climática e escondem os custos reais de não agir.
É neste contexto que o conceito de degrowth, ou decrescimento, ganha relevância. Trata-se de uma visão económica que defende que as economias mais ricas devem reduzir a produção prejudicial e priorizar o bem-estar em vez do crescimento económico ilimitado. Um estudo recente da London School of Economics (LSE) e do Institute for Environmental Science & Technology da Universidade Autónoma de Barcelona (ICTA-UAB) analisou o apoio público a esta proposta. Foram inquiridas mais de 6.200 pessoas no Reino Unido e nos Estados Unidos, revelando um apoio significativo: 74 a 84% dos participantes no Reino Unido e entre 67 a 73% nos EUA concordaram com a ideia de reduzir a produção prejudicial e focar no bem-estar. O estudo demonstra ainda que, quando os objetivos do degrowth são explicados de forma clara, a aceitação aumenta consideravelmente, independentemente do rendimento ou da posição social, indicando uma consciência crescente de que enfrentar desafios globais exige mudanças estruturais profundas, e não apenas ajustes pontuais.
Estes dados sobre o apoio público ao degrowth conectam-se diretamente com os riscos que as alterações climáticas impõem à saúde mental. O relatório do Tavistock Institute of Human Relations (2024) documenta como o clima extremo e a consciência da crise ambiental provocam eco-distress, ansiedade, depressão, perturbação de stress pós-traumático (PSPT) e stress, especialmente em jovens, grupos marginalizados e trabalhadores de setores vulneráveis, como agricultura e pescas. Eventos climáticos extremos, insegurança económica e deslocações forçadas aumentam o risco de problemas psicológicos, mostrando que o bem-estar humano já está a ser comprometido pela crise climática. Nesse contexto, o estudo da LSE e do ICTA-UAB ajuda a compreender por que existe um apoio significativo a alternativas económicas focadas no bem-estar: as pessoas percebem que modelos baseados apenas no crescimento económico não protegem a sua saúde nem a qualidade de vida frente às ameaças climáticas.
Esta constatação encontra ressonância com o Impact Accounting. Ferramentas como as desenvolvidas pela Value Balancing Alliance (VBA), baseadas no OECD Well-being Framework, permitem medir sistematicamente como atividades económicas e políticas públicas impactam dimensões essenciais do bem-estar, incluindo saúde, educação, segurança, relações sociais, rendimento e qualidade ambiental. Ao integrar estas métricas nas decisões económicas e climáticas, empresas e governos podem alinhar políticas e práticas com aquilo que o público já apoia e com as evidências sobre os riscos reais que o clima impõe à saúde e ao bem-estar. Exemplos práticos incluem projetos de habitação acessível com impressão 3D que medem simultaneamente impacto económico, social e ambiental; a utilização de calor residual industrial para beneficiar comunidades próximas, reduzindo emissões e custos energéticos; e avaliações de impacto em toda a cadeia de valor em setores como retalho, saúde e telecomunicações. Estes casos mostram que é possível quantificar, de forma concreta e comparável, os benefícios para a sociedade e o ambiente, orientando decisões económicas que promovam bem-estar e sustentabilidade.
Em conjunto, estas linhas de evidência mostram que não se trata apenas de discutir crescimento económico ou reduzir emissões de carbono: trata-se de proteger vidas humanas e garantir qualidade de vida. O apoio público ao degrowth, os impactos documentados das alterações climáticas na saúde mental e as ferramentas de Impact Accounting convergem para uma conclusão clara: políticas eficazes devem colocar o bem-estar no centro da tomada de decisão, integrando ciência, economia e valores sociais. O futuro não se mede apenas em crescimento ou PIB, mas na capacidade das sociedades de proteger a saúde, a dignidade e a qualidade de vida das pessoas.
Sofia Conde, Investigadora do Center for Responsible Business da CATÓLICA-LISBON