Portugal está a envelhecer rapidamente e continua a ver o talento com mais de 50 anos como um custo. É curto de vista. Quando juntamos experiência e tração (mais velhos com jovens), as equipas tornam-se mais sólidas e úteis. Não é teoria: com regras simples e métricas claras, a intergeracionalidade acelera resultados que contam para o país.

 

Portugal é um dos países mais envelhecidos da Europa. Segundo dados do EUROSTAT, na União Europeia, mais de um quinto das pessoas tem 65 anos ou mais. Em Portugal, o INE mostra que esta tendência vai continuar até ao fim do século. Isto significa que temos muita força de trabalho experiente, com valor a acrescentar, e que estamos a aproveitar mal esse valor.

Em vez de separarmos “coisas para jovens” de “coisas para mais velhos”, acentuando o fosso pela insistência na mitificação, seria mais sensato e, diria, racional, misturar idades e competências diversas na mesma equipa. Os mais velhos trazem a curva da experiência sobre o que funciona e o que falha. Os mais novos trazem ferramentas digitais, mais flexibilidade e novos caminhos. Apenas para nomear, num lampejo, poucas das muitas possibilidades.

O que dizem os estudos?

Dizem-nos, por exemplo, que o fundador “miúdo-génio” (Zuckerberg e Steve Jobs da vida) é raro. Um estudo grande nos EUA concluiu que, entre as novas empresas que mais crescem, a idade média do fundador é de 45 anos, e que a experiência prévia no setor onde atuam, é o melhor sinal de sucesso (AER – American Economic Review - Age and High Growth Entrepreneurship - 2020).

Mas claro que, equipas com idades diferentes, não funcionam apenas como que por efeito de um toque de magia. Funcionam quando há regras claras e respeito mútuo entre todas as partes envolvidas. O mecanismo é simples: a diversidade de idades é uma vantagem, nomeadamente em termos de inovação, mas apenas quando há um debate saudável de ideias, e não guerras pessoais. O conflito cognitivo, aumenta a inovação da equipa, enquanto o conflito afetivo diminui a inovação da equipa (Frontiers in Psychology - Generational diversity and team innovation: the roles of conflict and shared Leadership - 2025).

Fechar o gap geracional: transformar o conflito em vantagem competitiva

Estamos a envelhecer, a viver mais anos e a trabalhar em equipas onde cabem quatro gerações em simultâneo. Se não soubermos gerir este encontro de idades, o resultado será o desperdício de talento. Se o fizermos bem, talvez seja o maior motor de inovação e de futuro das nossas organizações.

O chamado “gap geracional” não é apenas um choque de estilos de vida ou de referências culturais. É o resultado de quatro revoluções que acontecem ao mesmo tempo: no local de trabalho, na tecnologia, na longevidade e na forma como olhamos para as carreiras e para o propósito. Trabalhamos remotamente, em modelos híbridos, com equipas dispersas; temos agentes de inteligência artificial a entrar nas equipas; vivemos mais anos, com carreiras mais longas; e a relação das pessoas com o trabalho mudou, deixando de ser apenas sobre salário e segurança, para passar a incluir flexibilidade, sentido e aprendizagem contínua.

Neste cenário, jovens talentos e líderes séniores (ou “mais velhos”, para sensibilidades mais apuradas) enfrentam desafios distintos, mas profundamente ligados entre si.

Quem entra hoje no mercado de trabalho encontra um ambiente hipercompetitivo, incerto, cheio de promessas de impacto rápido e de frustração igualmente rápida. Trazem mais fluência digital, maior exposição global, disponibilidade para mudar de rota. Mas carregam também o peso de estereótipos (“não querem trabalhar”, “não aguentam pressão”), a ansiedade de ficar para trás e a exigência permanente de se manterem relevantes.

Do outro lado, líderes séniores (“mais velhos”) lidam com a erosão da autoridade formal e da liderança baseada apenas na hierarquia. Precisam de reaprender a liderar em modelos colaborativos, com pessoas que questionam mais, exigem transparência e não se revêm com frases como “sempre foi assim”. Têm experiência, têm redes, têm memória institucional (ativos preciosos num mundo em transição), mas sentem a pressão da sucessão, as curvas de aprendizagem tecnológicas e o receio de se tornarem dispensáveis.

O erro é olharmos para estes dois lados como se estivessem em campos opostos. O grande “ponto cego” das organizações é não perceber que o maior valor está na interseção entre gerações. Não se trata de escolher entre a velocidade dos mais novos e a precisão dos mais velhos. Trata-se de desenhar contextos em que uma coisa amplifica a outra. Na prática, isto significa passar da convivência passiva à colaboração intencional.

Há pelo menos três caminhos concretos para fechar o gap geracional nas organizações.

O primeiro é a aprendizagem entre gerações. Não basta juntar idades diferentes na mesma sala. É preciso criar mecanismos formais que, quando bem concebidos, valem mais do que dezenas de horas de formação tradicional.

O segundo caminho é o da Inovação Intergeracional. Quando se cria espaço real para debate de ideias, com segurança psicológica e liderança partilhada, o conflito cognitivo (sobre o que fazer, e como fazer) torna-se um motor de inovação, em vez de se transformar em conflito pessoal.

O terceiro caminho é a liderança transgeracional. Não se trata de colocar um “jovem token” na sala, mas de integrar pessoas de diferentes idades com mandato claro, responsabilidade e voz ativa. Governanças transgeracionais enviam uma mensagem simples e poderosa: o futuro e o passado sentam-se à mesma mesa para decidir o presente.

Fechar o gap geracional não é uma causa simpática para incluir num relatório de sustentabilidade. É uma estratégia de sobrevivência e competitividade. Organizações que desperdiçam talento sénior, e esgotam talento jovem, acabam presas numa espiral de rotatividade, perda de conhecimento crítico e incapacidade de inovar com consistência. As que conseguem transformar a diferença de idades em ecossistemas de aprendizagem contínua, constroem capital humano à prova de futuro.

A escolha é menos filosófica do que parece. Ou continuamos a alimentar narrativas de suspeita mútua entre gerações, ou assumimos, com intenção e pragmatismo, que o próximo salto de produtividade, inovação e bem-estar nas nossas organizações, depende da forma como juntamos pessoas de 20, 40, 60 ou 70 anos a trabalhar lado a lado. O gap geracional não se fecha sozinho. Ou o enfrentamos de frente, com políticas, programas e exemplos claros, ou continuaremos a confundir o desperdício de talento com inevitabilidade.

A boa notícia é que a revolução já começou. Cabe a cada, pessoa, a cada organização decidir se quer ficar a ver “passar o navio”, ou se prefere “entrar em campo”. Eu e a Sara Aguiar, jovem talento (e quanto!) de 28 anos, já estamos a fazer o Walk the Talk, com esta metodologia que acabo de partilhar para aproveitar o valor entre gerações.

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Frederico Fezas Vital, Professor na CATÓLICA-LISBON