Uma cidade a 10 à hora

Imprensa
Sexta, Maio 6, 2022 - 16:45

A oposição socialista a Carlos Moedas na Câmara de Lisboa aprovou uma proposta do Livre pelo clima contra a guerra. A proposta é para reduzir o limite de velocidade de 80 para 70 km em estradas como a 2ª circular ou o eixo Norte-Sul, de 50 para 40 na 24 de julho ou na Av. de Ceuta, de 50 para 30 na Av. de Roma. Também proíbe os carros na Av. da Liberdade aos domingos e feriados.

A vereadora do Livre diz que a proposta vai salvar vidas, poupar combustível, reduzir a dependência energética da Rússia, tornar o trânsito mais fluído, evitando engarrafamentos. Disse estas e outras coisas igualmente divertidas.

Não sei como funciona a Câmara e não sei se medidas destas da oposição têm mais efeitos do que nos fazer rir. Mas vamos supor que têm. Quais são os efeitos deste tipo de medidas? Quem perde e quem ganha?

Vamos supor que a circulação atual é a necessária e que os carros circulam à velocidade máxima. O efeito seria ter os carros na estrada 40% mais tempo na Av. de Roma, 20% mais tempo na 24 de julho e 13% mais na 2ª circular. Mais carros, portanto, durante mais tempo.

Algumas pessoas, desanimadas ou enervadas, vão tentar alternativas. Mas será que há? Autocarro, não; tem os mesmos limites. Talvez o metro; mas é possível aumentar a capacidade?

Também há a bicicleta e a trotinete. Se o carro anda a 30 à hora, mais vale andar de trotinete. Mas quem é que pode andar de trotinete?

Quem é que realmente ganha com isto?

Os mais pobres, que vivem mais longe do centro, perdem muito. Se já perdiam duas horas por dia, agora perdem mais meia hora.  

Os que não podem trabalhar de casa, normalmente também mais pobres, perdem mais.

Os velhos, as grávidas, os doentes, sem bicicleta ou trotinete, perdem muito.

As famílias com filhos pequenos, que passam o dia a levá-los de um lado para o outro, perdem muitíssimo.

Os que moram no centro, que trabalham de casa ou nos cafés do bairro, jovens e saudáveis, esses não perdem nem ganham. O centro de Lisboa está cheio deles. Dão imenso estilo à cidade e têm sotaques engraçadíssimos. A maior parte dos que não falam português pagam também metade dos impostos dos que falam português. Interessante forma de discriminação fiscal.

Os visitantes talvez ganhem. Isolados em zonas de poluição zero, pensam que Lisboa é uma cidade linda e rica. Longe da confusão das filas intermináveis de automóveis com gente resignada a ser pobre e maltratada.

Pedro Teles, Professor na CATÓLICA-LISBON