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Pandemia deve acentuar desigualdades socioeconómicas em Portugal, em especial para os jovens

Autores: Joana Silva, Kamil Kouhen, Madalena Gaspar e Martim Leitão

A pandemia da Covid-19 vai, provavelmente, acentuar desigualdades em Portugal. A dureza da crise vai ser sentida pelos segmentos vulneráveis da população. Trabalhadores mais jovens e menos educados, que detém à partida trabalhos mais inseguros e menos bem remunerados, apresentam-se mais frágeis diante do choque, com pequenas empresas e regiões menos desenvolvidas a acartar as perdas mais candentes. Evidência de crises do passado mostra que os efeitos neste tipo de trabalhadores, de empresas, e de regiões são mais duradouros.

É provável que a pandemia da Covid-19 aumente a desigualdade de rendimento, invertendo o progresso registado nos últimos quatro anos, em que Portugal se tinha aproximado dos valores europeus, mesmo mantendo-se significativamente acima da média Europeia. A crise acarretará grandes dificuldades para os segmentos mais vulneráveis da população. Trabalhadores com empregos de baixa remuneração, jovens e/ou com baixa escolaridade (que já estão em empregos menos seguros e com baixos salários) são os que terão maiores probabilidades de perda. Em particular, 37% de todos os trabalhadores no decil de salário mais baixo trabalham simultaneamente em setores não essenciais e dentro destes em tarefas que não podem ser realizadas em regime de teletrabalho, enquanto estes empregos com estas características representam apenas 9% do emprego entre os trabalhadores no decil dos salários mais elevados.  

Figure 1. Vulnerabilidade do emprego por decil de salário, idade do trabalhador e tipo de contrato de trabalho (Download Excel file)

Os mesmos padrões são observados em termos de nível de qualificação, com 83% dos trabalhadores pouco qualificados em empregos que não podem ser realizados em teletrabalho, contra 30% entre os trabalhadores altamente qualificados. A incidência nas diferentes gerações é distinta: os jovens até 24 anos têm quase o dobro da probabilidade de trabalhar em empregos que não podem ser realizados em teletrabalho em sectores não essenciais do que os trabalhadores com idade superior a 40 anos de idade e 1.6 vezes maior probabilidade de trabalharem em sectores altamente sensíveis. Eles têm também um maior nível de precariedade laboral, logo maior probabilidade de perder o emprego. Evidências da última crise em Portugal sugerem que o salário médio dos jovens trabalhadores caiu cerca de um terço (31%) em termos reais, uma redução cinco vezes maior do que os ganhos médios salariais gerais (6,3%) (Rodrigues et al., 2016). Trabalhadores sem vínculo permanente, a tempo parcial e estagiários estão particularmente em risco. Paralelamente, os trabalhadores do sector privado terão um risco de perda de emprego maior que os funcionários públicos, especialmente quando não estão inseridos nos quadros de pessoal das empresas.

Figura 2. Vulnerabilidade por tamanho e idade da empresa.
Cálculo dos autores usando a base de dados Quadros de Pessoal 2017. 

Empresas pequenas, jovens, e/ou localizadas em regiões menos desenvolvidas serão as mais afetadas (Figura 2). Regiões menos desenvolvidas provavelmente vão sofrer mais. O Algarve apresenta uma percentagem de emprego em setores não essenciais relativamente alta, quando comparada com as demais regiões. O mesmo é válido para trabalho desde casa e interações pessoais: no Algarve, a percentagem de trabalhos que não se pode realizar a partir de casa é alta quando comparada com as outras regiões e o mesmo se aplica quanto à percentagem de trabalhos que requerem interações pessoais. 

Figura 3. Vulnerabilidade por região. 

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