A Tupperware já é um caso de estudo de muitas cadeiras de Gestão, Marketing e Estratégia. Como é que uma empresa que teve tudo entra em processo de falência?

Já foi uma love brand. Já foi uma marca de referência nas casas do mundo inteiro. Já foi um meio ou uma fonte de rendimento de muitas mulheres que não tinham permissão para trabalhar fora de casa. Já foi líder tecnológica quando introduziu tampas herméticas (“double-sealed air and water tight”). Já foi líder a introduzir design nas cozinhas. Já foi quase tudo...

No final do mês de setembro anunciou que está em processo de falência.

Será (já é) um caso de estudo de muitas cadeiras de Gestão, Marketing e Estratégia. É um exemplo (tal como muitas outras empresas) que está tão empenhada no “estamos a fazer bem, vamo-nos adaptando às novas gerações”, mas na realidade, não ouvem realmente o cliente. Não estão dispostas a mudar estruturalmente quando as novas gerações mudaram estruturalmente.

Se nos perguntarmos se a Tupperware parou no tempo, somos tentados a responder imediatamente que sim, mas numa segunda fase percebemos que não. A Tupperware foi evoluindo consideravelmente.

Todos os anos a empresa lançava novos produtos adaptados às novas necessidades: produtos adaptados para micro-ondas, para cozinhar e para aquecer, produtos para levar nas lancheiras, produtos com novos designs. Todos os anos, cada vez mais, havia a preocupação de exibir a sustentabilidade como bandeira da marca – já era pela utilização e reutilização de produtos, mas também no tipo de materiais utilizados, no cumprimento de normas internacionais de sustentabilidade – e comunicava ativamente estas ações.

A marca notabilizou-se ainda pelo seu canal de venda, através das “Reuniões Tupperware”. Era uma forma de levar algum rendimento a mulheres que nos anos 60 ainda estavam impedidas de sair de casa para obter algum rendimento. Mas, mesmo assim, a marca adaptou-se. Ao perceber que as novas gerações estavam a comprar mais por impulso e no retalho, começou a criar alguns pontos de venda e pop-up stores que faziam e fazem venda direta. Ao perceber que a nova geração estava a comprar on-line, adaptou-se e passou a fazer vendas on-line diretas com ou sem a intervenção de um “Consultor Tupperware”.

Mas, tal como muitas empresas, estaria realmente a ouvir a nova geração?

Alguém realmente acredita que uma geração que nasce com os telemóveis agarrados aos dedos, vai chamar uma agente Tupperware para fazer uma compra? Uma geração que está habituada a ter experiencias de compra imediatas, praticamente sem barreiras à compra (compra com apenas 1 botão, sem introduzir dados de pagamento etc.) vai a uma reunião para comprar caixas? Uma geração que apesar de se dizer ecológica nunca pagará €30 por uma caixa que pode custar €10 (mesmo que tenha uma longevidade menor)? Uma geração que por muito independente que se queira mostrar e achar que é dona das suas decisões, só compra as caixas que a influenciadora mais “it” do Instagram recebe como “parceria” e mostra nas suas stories?

É uma geração estruturalmente diferente das donas de casa das reuniões Tupperware. Não tem os mesmos interesses, os mesmos valores, os mesmos canais de compra ou sequer os mesmos canais para ser influenciada.

Pequenos ajustes não funcionam (obviamente não funcionaram). A marca (a Tupperware e muitas que por aí andam pelo mesmo caminho, desta e de muitas outras áreas de negócio) tem de repensar estruturalmente a sua proposta de valor. Tem de repensar a sua estratégia como produto e como marca. Tem de repensar o seu modelo de negócio. Terá de alterar estruturalmente os seus canais de comunicação. Terá de repensar e alterar estruturalmente a sua estratégia de preço.

E principalmente, terá de ouvir realmente o que quer e pensa a nova geração. Esta “nova geração” que já não são “miúdos”. Inclui mães e pais de família...em alguns casos, avós de família!

Rute Xavier, Docente da CATÓLICA-LISBON