A matéria-prima mais decisiva para o sucesso das empresas está em carência crescente. Ouvimos falar dos problemas de acesso aos metais de terras raras, mas algo muito mais indispensável para os negócios tornou-se ainda mais escasso: o respeito.
Respeito é a consideração que temos por algo ou alguém que consideramos importante. Ele é a base indispensável para uma organização eficaz e equilibrada. Camaradagem, amizade se possível, mas pelo menos respeito. Todos gostamos, desejamos, ansiamos por respeito; temos de respeitar os outros. A alternativa são o desprezo e a agressão, que arruínam a instituição.
Numa empresa todos se devem respeitar. Respeito pelos superiores e pelos inferiores; respeito pelos colegas e, mais ainda, pelos adversários; respeito pelos eficientes, mas também pelos trapalhões, preguiçosos, maldosos; respeito pelos que se dão ao respeito e pelos que não se dão ao respeito, porque, sendo pessoas, merecem respeito.
Respeitar não significa condescender, tolerar, ser cúmplice. Significa enfrentar os defeitos e os conflitos sem esquecer que a dignidade daqueles que se nos opõem é muito mais do que o mal que fazem. Significa compreender que cada pessoa, pelo simples facto de o ser, é um mistério incompreensível, tem uma excelência superior e isso tem de ser fatorizado na atitude que temos para com ela. Podemos debater, podemos discutir, podemos castigar, podemos lutar, podemos até despedir, mas temos de o fazer sempre com respeito.
Esta substância, respeito, tem propriedades muito curiosas. Pode-se dizer que funciona como um vírus. Quanto mais o damos, mais recebemos em troca; por outro lado, faltar ao respeito gera perda de respeito à nossa volta. Numa epidemia de falta de respeito, desaba toda a comunidade.
Ora hoje o respeito está em decadência. Vivemos numa época em que política, economia, cultura, se baseiam na acusação, insulto, menosprezo. Lutamos apaixonadamente por causas nobres, mas sem a nobreza de respeitar aqueles que se nos opõem. Cuidamos da elevação dos nossos objectivos, não do decoro dos nossos meios. Temos em grande apreço a originalidade, rebeldia, heterodoxia, e confundimos isso com desrespeito. Mesmo os que lutam pelo respeito dos direitos das minorias e desintegrados, costumam fazê-lo desrespeitando os que acusam de desrespeito. Pretendemos construir a sociedade ideal utilizando métodos de carroceiro.
Vale a pena ver as causas do problema, para o poder extirpar. O mal vem desde as origens. A nossa civilização moderna começou por desrespeitar a Igreja, protestando pela pureza da doutrina; depois desrespeitou o rei e o governo em nome da justiça social; ultimamente desrespeita qualquer autoridade a favor do indivíduo. Em todos estes casos promovemos o desrespeito alheio, exigindo que nos respeitem.
Muitos apontam para elementos tecnológicos. É verdade que a internet, e em especial as redes sociais, baixaram o nível dos nossos debates. Escrevem-se em posts e dizem-se em podcasts coisas que nunca fariam cara ou cara ou mesmo numa carta. A alegada anonimidade digital revela publicamente os instintos mais rudes da nossa natureza.
Pior é a curiosa evolução da ficção mediática. A era da informação, dizendo-se democrática, tem de respeitar direitos; mas todas as aventuras precisam de vilões, cujo ódio constitui a própria base do enredo. Para criar um inimigo que os espetadores possam desprezar sem violar o respeito democrático foi preciso lançar mão de personagens desprovidas de dignidade. Assim os nossos écrans estão cheios psicopatas, zombies, aliens, orcs e afins, entidades más absolutamente, que podemos abominar sem complexos. Ora essas entidades fictícias são facilmente transponíveis para a vida real. Hoje os discursos políticos e as conversas de café estão tão pululadas de vampiros e monstros quanto os videojogos.
No entanto, para lá disto tudo, família e sociedade, mas também empresa, mercado e economia são comunidades de pessoas. Só funcionam com respeito.
João César das Neves, professor catedrático na CATÓLICA-LISBON