Na passada terça-feira, 29 de abril, a CATÓLICA-LISBON promoveu a 3.ª edição do Family Business Day, uma iniciativa anual organizada pelos alunos da unidade curricular Mastering Family Businesses, com o objetivo de desmistificar mitos e refletir sobre os desafios e oportunidades das empresas familiares.

Sob o tema “The Truth Behind Family Business: Myths vs. Facts”, o evento reuniu líderes empresariais, gestores de fundos, académicos e estudantes para um debate em torno de questões como o legado, a inovação, a sucessão geracional, a governança e a longevidade das empresas familiares.

Com moderação a cargo dos alunos da unidade curricular, as quatro mesas-redondas contaram com representantes de empresas como MEXT – Mota-Engil, Casa Mendes Gonçalves, Porcel, Farmácias Silveira, Grupo Nabeiro, Grupo Manuel Champalimaud e Riberalves, bem como da sociedade de capital de risco C2Capital.

A sessão de abertura ficou a cargo de Filipe Santos, Dean da CATÓLICA-LISBON, que destacou o papel estrutural destas empresas na economia portuguesa. “São a espinha dorsal da nossa economia há mais de 50 anos, com uma dinâmica de longo prazo que as distingue das restantes”, afirmou, salientando também a importância do seu enraizamento nas comunidades e o impacto social que exercem nos territórios onde operam. Num mundo crescentemente marcado pela fragmentação geopolítica, Filipe Santos alertou ainda para a relevância de manter “centros de decisão nacionais” como forma de proteger a identidade e a autonomia estratégica das empresas.

A ideia de que o legado é um obstáculo à inovação foi amplamente contestada ao longo do encontro, com vários intervenientes a demonstrar como a herança dos fundadores pode ser uma alavanca de transformação.

Sílvia Mota, CEO da MEXT – Mota-Engil, defendeu que “o legado tem o espírito de inovação e empreendedorismo”, e que é precisamente esse capital simbólico que permite projetar o futuro com solidez: “Procuramos a inovação, mas com os pés assentes na terra e com a cultura original da Mota-Engil”.

Na mesma linha, Carlos Gonçalves, administrador da Casa Mendes Gonçalves, sublinhou que o planeamento a longo prazo é uma oportunidade de gerar verdadeiro impacto. “Temos uma responsabilidade muito grande e uma oportunidade muito grande. Planear a longo prazo permite criar impacto”, afirmou. Para o administrador, a missão da empresa ultrapassa os limites do negócio: “Temos a responsabilidade de desenvolver a região e o país”.

A ligação entre legado e inovação foi ainda reforçada por Filipe Santos, que defendeu que a criatividade prospera mais em ambientes com restrições do que em contextos ilimitados. “Quando temos restrições somos mais criativos”, disse, acrescentando que “entre uma inovação radical ou uma melhoria constante, a segunda ganha”. A chave, segundo o Dean da CATÓLICA-LISBON, está no propósito partilhado: “Quando as pessoas partilham de um propósito comum, fazem compromissos”.

A sucessão geracional, outro tema central da conferência, foi abordada por Luísa Roque, presidente da Porcel, e João Silveira, CEO das Farmácias Silveira. Ambos defenderam que a transição entre gerações deve ser preparada com tempo, exigindo experiência externa e capacidade de adaptação.

“Humildade, curiosidade, ouvir todos e decidir sozinho” foi a fórmula partilhada por Luísa Roque para garantir uma liderança legítima. Para a presidente da Porcel, é essencial que os sucessores familiares passem por experiências profissionais fora da empresa: “Devemos ter sempre uma experiência de trabalho fora para os líderes familiares serem mais credíveis e não verem a sucessão como uma obrigatoriedade”.

João Silveira partilhou a mesma visão: “A experiência fora da empresa acrescentou valor quando fui trabalhar com a família”, reconheceu. Ambos identificaram a geração mais velha como o maior obstáculo à sucessão. “O tampão para a sucessão está na geração acima”, afirmou João Silveira, numa conclusão que ressoou entre vários participantes.

A importância de uma governação sólida, capaz de equilibrar tradição com exigências de gestão moderna, foi outro dos eixos do debate. Dinis Cunha, International Markets Sales Director do Grupo Nabeiro, não pertencendo à família fundadora, destacou tanto o valor da cultura empresarial como os riscos de uma gestão demasiado fechada em si própria: “Quando estamos há muito tempo a trabalhar numa empresa temos uma visão mais curta do ecossistema e mais fechada”. No entanto, apontou como essencial manter vivo o espírito do fundador: “Transmitir o espírito do comendador Sr. Rui, a vontade de fazer mais e com humildade”.

Também André Oliveira, da Partner da C2Capital, defendeu a continuidade familiar como um ativo. “Preservar a gestão familiar é o objetivo da C2Capital. A continuidade é crítica para a estratégia de investimento”. Ainda assim, deixou um aviso claro: “O sinal de alarme é quando uma gestão é incapaz e não tem motivação. O desafio é perceber se há disponibilidade para reforçar a gestão no sentido da proteção da empresa”.

A sessão dedicada à longevidade empresarial contou com os contributos de Tomás Champalimaud, vice-presidente do Grupo Manuel Champalimaud, e Ricardo Alves, administrador da Riberalves. Para Tomás Champalimaud, o segredo da longevidade passa por “ter uma família que perdure no tempo, ter património e um propósito comum”. O vice-presidente do Grupo reforçou a noção de que os líderes devem agir com sentido de responsabilidade intergeracional: “Somos usufrutuários e não donos da empresa”. O risco, alertou, surge quando a família cresce mais depressa do que a empresa, ou quando falta humildade para reconhecer quem está (ou não) preparado para liderar.

Já Ricardo Alves destacou a importância de ter uma visão clara e uma liderança partilhada. “Clareza muito focada em números, KPI’s, missão, visão para a empresa. A liderança deve-se a uma equipa”. Para o administrador, contar com membros externos no conselho de administração é fundamental: “São contraditórios, «metem o dedo na ferida» e trazem outras ideias e formas de ver as coisas”.

No encerramento, Rita Coelho do Vale, Dean para os Programas de Licenciatura da CATÓLICA-LISBON reforçou a importância de refletir sobre os desafios da sucessão e da responsabilidade intergeracional nas empresas familiares.

Com um auditório cheio, composto por profissionais de empresas familiares, estudantes e membros da comunidade académica, a sessão confirmou a relevância e atualidade do tema.