E se fosse possível medir o impacto social e ambiental gerado por uma empresa com o mesmo rigor com que medimos o seu desempenho financeiro? Esta pergunta, que há poucos anos pareceria utópica, está hoje no centro de uma transformação profunda na forma como as empresas se relacionam com a sociedade e com o planeta. A resposta começa a ganhar forma através da abordagem inovadora do Impact Accounting.

Durante décadas, o desempenho das empresas foi medido quase exclusivamente em termos financeiros: receitas, lucros, crescimento, ou rentabilidade para os acionistas. Mais recentemente, o movimento ESG (Environmental, Social, and Governance) procurou alargar esta visão, incorporando preocupações com o ambiente, os direitos humanos, ou a ética empresarial. No entanto, à medida que o ESG se tornou mainstream, surgiram críticas sobre a sua eficácia real. Muitos relatórios ESG continuam a ser vistos como exercícios de conformidade ou de branding, com pouca comparabilidade entre empresas e escassa utilidade para a tomada de decisão.

É neste contexto que surge o Impact Accounting, uma abordagem inovadora que pretende transformar a maneira como medimos e comunicamos o valor criado (ou destruído) pelas empresas. A grande diferença está na quantificação monetária dos impactos sociais, ambientais e humanos que uma organização gera. Em vez de se limitar a indicadores como toneladas de CO₂ emitidas ou número de horas de voluntariado, o Impact Accounting atribui um valor financeiro a essas externalidades, tornando-as comparáveis, auditáveis e integráveis nos sistemas de gestão. 

O conceito pode parecer técnico, mas o princípio é simples: se uma empresa beneficia ou prejudica a sociedade, isso deve ser refletido de forma objetiva nos seus relatórios de desempenho. Por exemplo, se um programa de formação melhora as perspetivas de emprego dos colaboradores, esse benefício pode ser medido através do valor económico criado. Por outro lado, se um processo industrial emite gases com efeito de estufa, o seu impacto pode ser monetizado com base no custo social do carbono. Para este caso em concreto, especialistas calculam que o impacto social total de cada tonelada de CO₂ emitida é de US$236.

Esta prática está a ganhar tração a nível internacional, com organizações como a International Foundation for Valuing Impacts (IFVI), a Value Balancing Alliance (VBA) ou a Impact Economy Foundation (IEF) a liderarem o desenvolvimento de metodologias robustas. Também a Comissão Europeia tem mostrado interesse, ao integrar o princípio da dupla materialidade na nova Diretiva de Reporte de Sustentabilidade (CSRD), exigindo que as empresas reportem não apenas o impacto dos riscos sociais e ambientais no seu desempenho financeiro, mas também o impacto das suas atividades na sociedade e no ambiente.

Portugal não está alheio a esta evolução. No passado dia 3 de junho, a Católica-Lisbon, através do Centro for Responsible Business and Leadership, e a PwC Portugal organizaram a primeira conferência nacional sobre Impact Accounting, reunindo académicos, especialistas internacionais e líderes empresariais num debate que mostrou como esta metodologia pode ser aplicada de forma prática e estratégica. Foram discutidas experiências reais de empresas que já iniciaram este caminho, os desafios de implementação e a necessidade de colaboração internacional para garantir padrões comuns e credíveis.

A mensagem que ficou é clara. O Impact Accounting não é apenas mais um mecanismo de reporte, mas sim uma nova abordagem para medir o valor empresarial de forma mais justa, transparente e sustentável. Uma linguagem que permite alinhar os interesses dos investidores com os da sociedade, promovendo decisões mais informadas e responsáveis.

Naturalmente, há desafios pela frente, tais como a falta de dados, a complexidade metodológica ou a mudança cultural dentro das organizações. No entanto, os benefícios são significativos: reduzir o risco de greenwashing, reforçar a confiança dos stakeholders, apoiar decisões estratégicas e, acima de tudo, contribuir para um modelo económico mais sustentável e inclusivo.

Como escreveu Peter Drucker, “o que não se mede, não se gere”. O Impact Accounting convida-nos a fazer exatamente isso: ir além do desempenho financeiro e começar a contar o que verdadeiramente conta.

Filipa Lancastre, professora da CATÓLICA LISBON