Considera que o seu maior risco foi ter saído do mundo da ciência para entrar no da gestão, quando começou a colaborar com a Procter & Gamble. Hoje, Maria Estarreja é diretora executiva de marketing e do Retail Innovation Lab da CATÓLICA-LISBON, e acaba de ver reconhecido o seu trabalho no setor do retalho a nível internacional.
A prestigiada revista norte-americana especializada em retalho Rethink Retail e a Microsoft nos EUA divulgaram a lista das personalidades mais influentes no retalho mundial. Há vários portugueses no 2024 Top Retail Expert, entre eles encontramos Maria Estarreja que foi distinguida na categoria Academia.
Maria Estarreja é atualmente diretora executiva de marketing e do Retail Innovation Lab (RIL) da CATÓLICA-LISBON, e diretora executiva da licenciatura em Gestão Comercial e de Retalho pela mesma Instituição onde leciona nos Mestrados e Programas de Executivos. É também fundadora e managing partner da VICI Consultancy e board member da Cerealis.
Em entrevista ao Link to Leaders, a gestora fala do seu percurso profissional que começou na Procter & Gamble, onde esteve em diferentes áreas como Marketing, Financial Analysis e Supply Planning, do prémio que acaba de receber, dos desafios do setor do retalho e dos seus projetos para o futuro.
Quem é a Maria Estarreja?
Uma mulher enérgica, criativa, que gosta de se apaixonar pelo que faz, de investigar e analisar, de inovar e transformar, de fazer acontecer e de implementar juntamente com equipas, de comunicar e de transmitir conhecimento. Alguém que tem sempre tentado equilibrar a vida pessoal e profissional, sendo mãe de dois filhos, uma fanática desportista, uma leitora insaciável, alguém que gosta de escrever, pintar, de estar com amigos, que adora música, mar e de viajar e que defende a dedicação, a iniciativa e a verdade. Que aprecia fazer diferente, que arrisca e adora aprender, incluindo com os seus próprios erros. Que aposta no desenvolvimento de negócios, marcas e pessoas, procurando sempre novas oportunidades e diferentes abordagens.
“É muito bom ver o nosso trabalho e caminho profissional serem apreciados. São muitos anos de entrega e dedicação que foram distinguidos, o que muito agradeço”.
A Rethink Retail e a Microsoft nos EUA acabam de divulgar a lista das personalidades mais influentes no retalho mundial. A Maria foi distinguida na categoria Academia 2024 Top Retail Expert. Estava a contar com este reconhecimento?
Fui apanhada de surpresa, pois nem sabia que tinha sido nomeada, e fiquei muito honrada com este reconhecimento internacional. É muito bom ver o nosso trabalho e caminho profissional serem apreciados. São muitos anos de entrega e dedicação que foram distinguidos, o que muito agradeço. Agradecimento extensível a quem ao longo destes anos apostou em mim, às várias equipas que tive a sorte de gerir e a colegas e parceiros que muito me têm ensinado ao longo do tempo.
Iniciou a sua carreira na Procter & Gamble. Foi diretora de marketing e de customer marketing do grupo Super Bock e esteve ainda na Nutricafés (atualmente Segafredo Zanetti) e na Nutrinveste (holding que na altura para além da Nutricafés tinha a Compal, a Sovena e a Triunfo). De todos os desafios pelos quais já passou, qual o que mais a marcou e teve impacto na sua carreira?
Não consigo identificar um, cada etapa acabou por ter trazido claras mais valias no meu percurso. A P&G foi a minha primeira e grande escola de gestão, finanças e de marketing. Foi a primeira empresa a apostar em mim, vinda do mundo científico. Foi onde descobri a minha paixão por marcas, negócios e resultados. Esta experiência abrangente permitiu-me compreender a importância de aprenderemos os objetivos e dificuldades das diferentes funções e departamentos, a fim de contribuir de forma eficaz para o crescimento dos negócios. No grupo Nutrinveste tive a hipótese de desenvolver o marketing estratégico, de mergulhar no mundo de fusões e aquisições, na avaliação de empresas e na estratégia global dos negócios.
Na Nutricafés desenvolvi mais as minhas competências na gestão de equipas alargadas, tendo gerido mais de 150 pessoas, das áreas de gestão comercial e vendas, assim como na comunicação institucional, responsabilizando-me pela primeira vez pela conta de exploração global de um negócio. Já no Super Bock Group tive o prazer de gerir grandes marcas, com liberdade para inovar, desenvolver novas campanhas de comunicação, lançar novas marcas, novos produtos e apostar nas parcerias estratégicas. Nos últimos anos na CATÓLICA-LISBON tenho mergulhado mais no universo digital e tecnológico que muito me fascina.
Tem dedicado a sua vida profissional às marcas e ao retalho. Tem sido uma aposta ganha?
Sem dúvida! Tenho tido oportunidade de criar, gerir e acompanhar o desenvolvimento de grandes marcas e de excelentes equipas, gerando resultados e conhecimento. Tanto a nível profissional como académico, tem sido uma jornada entusiasmante, repleta de projetos realizados de que muito me orgulho. Tenho aprendido muito com as equipas com as quais trabalhei e compreendi que o salto transversal entre diferentes áreas é fundamental para uma melhor visão macro do negócio. Tive também a sorte de ter tido líderes inspiradores no início da minha carreira, que enfatizaram a relevância de ter uma visão clara dos objetivos, estratégias bem definidas e saber implementar sem medo.
No percurso da minha vida profissional adotei mantras que me recordam da importância de sonhar alto, de olhar para os desafios de uma forma positiva, transformando-os em oportunidades, assim como da responsabilidade de desenvolvermos e motivarmos as nossas pessoas. Também tenho tido a felicidade de trabalhar em negócios e marcas líderes que me têm permitido transformar ideias e propostas em produtos e serviços de valor, desenvolvendo negócios de forma integrada, permitindo a satisfação de clientes e consumidores.
“O Retail Innovation Lab (RIL) tem a sua génese num projeto recente de um consórcio apoiado pelo PRR e que tem como parceiros a Sensei, a GALP, o Continente, entre outras empresas e universidades (…)”.
Como surgiu a ideia de criar o Retail Innovation Lab, do qual é diretora executiva? De que forma este laboratório tem contribuído para a inovação no retalho?
O Retail Innovation Lab (RIL) tem a sua génese num projeto recente de um consórcio apoiado pelo PRR e que tem como parceiros a Sensei, a GALP, o Continente, entre outras empresas e universidades. Atualmente está a expandir para outros territórios com diferentes parceiros nas áreas de tecnologia, digitalização e inovação do retalho em toda a sua cadeia de valor, cumprindo o seu propósito de providenciar insights, conhecimento, investigação, consultoria, suporte e treino na inovação de todo o retalho ao longo da jornada de compra e cadeia de abastecimento. Temos a visão de nos tornarmos numa referência académica na Europa, promovendo essa inovação no mercado, acompanhando e sustentando a sua transformação.
Quais os projetos futuros para o Retail Innovation Lab?
Estamos a alargar para mais áreas da tecnologia, tanto no que diz respeito à investigação científica como através de estudos e consultoria que possam apoiar empresas. Estamos a alargar os setores de negócio, incluindo diferentes áreas de retalho de serviços, incluindo banca e finanças, de indústrias automóveis, do setor da saúde, entre outros, onde pretendemos investigar, estudar e ajudar a implementar sistemas e tecnologia de ponta, incluindo IA, ao longo de toda a cadeia de valor do negócio. Estamos disponíveis para apoiar empresas e retalhistas de todos os setores do retalho que pretendam inovar, e estamos a alargar a equipa para responder aos vários desafios e solicitações que se apresentam.
No atual cenário global, quais as principais tendências que identifica para o setor do retalho? E como antecipa o futuro do retalho?
Acredito que o futuro passa por um retalho sustentável e tecnológico. Sustentabilidade na oferta, nos processos, no layout, nas propostas apresentadas, na gestão e responsabilização social das empresas assim como em outras áreas dos pilares ESG. Tecnologicamente, assistiremos desde a uma maior digitalização à implementação da IA em toda a cadeia de abastecimento e gestão de loja, passando pela robotização de diversas funções, alargamento de lojas automáticas com pagamentos facilitados, layouts tecnológicos que simplifiquem as compras e facilidade de tratamento de dados e processos que tornem o omnicanal numa realidade comum, permitindo uma maior satisfação da experiência de compra do cliente durante toda a sua jornada on e off-line.
“Felizmente, cada vez mais mulheres têm vindo a assumir posições de liderança assim como a criar negócios com coragem e determinação no setor”.
Como percepciona o desenvolvimento do empreendedorismo no feminino e quais desafios ainda precisam ser superados para promover uma maior representatividade feminina no setor do retalho?
Felizmente, cada vez mais mulheres têm vindo a assumir posições de liderança assim como a criar negócios com coragem e determinação no setor. No entanto, ainda existe um caminho a percorrer na mudança de mentalidades em determinadas áreas ou setores do retalho. Está mais do que estudado e comprovado em inúmeros indicadores que a igualdade de género impulsiona o desenvolvimento empresarial, trazendo lucratividade, maior rentabilidade e equilíbrio social. É importante ter visões complementares entre os géneros, valorizando as diferentes perspetivas e permitindo o fortalecimento de apetências nos colaboradores. O sucesso dos negócios passa também por reconhecer isto e aproveitar as vantagens trazidas pela colaboração e liderança de diferentes géneros.
Que conselho deixaria a uma jovem executiva com ambição de alcançar um cargo de liderança?
Que trace de forma clara ao seu caminho, que avance sem medo e abrace os desafios que possa vir a enfrentar sem desistir, expondo e defendendo as suas ideias. Que seja resiliente, que nunca duvide das suas capacidades e que se rodeie das pessoas certas, quer sejam chefias, mentores ou equipas de trabalho. Que seja sempre leal, honesta, que esteja em permanente aprendizagem e desenvolvimento assim como às suas equipas, que terá sempre a responsabilidade de motivar e acompanhar. Que se lembre que não está sozinha e que saiba ouvir antes de decidir como achar melhor, sem medo! Que assuma sempre tanto as suas vitórias como os seus erros, e que aprenda com ambos.
O que falta fazer à Maria executiva/líder?
Felizmente muita coisa! Tanto na área de liderança de topo do mundo da gestão, como na geração e transmissão de conhecimento. Novas empresas e negócios a liderar, a ajudar a desenvolver e a fazer crescer neste novo mundo da tecnologia que se nos apresenta.
E à Maria mulher?
Lançar pelo menos um livro, carimbar mais o meu passaporte explorando novos locais, assistir a concertos de artistas que aprecio e abraçar novas áreas de conhecimento, sempre.
Respostas rápidas:
Maior risco: Sair do mundo da ciência para entrar no da gestão, quando deixei a investigação científica e iniciei a minha colaboração com a Procter & Gamble.
Maior erro: Não ter celebrado ainda mais os sucessos juntamente com as equipas.
Maior lição: Somos capazes de muito mais do que pensamos, desde que não tenhamos medo de arriscar fazer diferente se assim decidirmos, dando sempre espaço à partilha de opiniões.
Maior conquista: Ter sempre com sucesso abraçado liderar novas áreas de negócio e novas funções