A criação de valor só será conseguida quando os interesses de todos os interessados relevantes forem tidos em conta na definição da estratégia. O foco no interesse dos acionistas tenderá a esbater-se.
Acredito que, a longo prazo, a vida neste planeta se está a tornar insustentável em várias áreas, desde o ambiente aos direitos humanos, da ética à discriminação por género e raça, da pobreza às condições de trabalho. Do ponto de vista do ambiente, a ciência tem feito o seu trabalho e ofereceu provas incontestáveis de que o clima mudou drasticamente, e o futuro do planeta está em risco. Aqueles que ainda tentam argumentar contra, perderão em breve a sua última gota de credibilidade.
A consciência destas realidades e o reconhecimento da insustentabilidade do planeta estão globalmente aceites, e os fenómenos da globalização e das novas tecnologias continuarão a incrementar essa consciência.
Neste contexto, as empresas têm um papel fundamental a desempenhar, no sentido em que têm os recursos, as capacidades e os processos para operar as mudanças necessárias.
O que nos leva à pergunta-chave para o envolvimento definitivo das empresas: existe de facto um business case para uma aposta estratégica na sustentabilidade?
Como em qualquer caso a criação de valor tem de resultar de menor custo, aumento de preço ou aumento de volume. Ou, no mínimo, que com isso se evite a destruição de valor, sobretudo quando está em risco a reputação da empresa.
Sobre a relação direta entre estratégia de sustentabilidade e melhores resultados, há vários estudos credíveis no passado recente e a única conclusão possível é que... “mais mal não faz”. Ou seja, pouco para que muitas empresas enveredem definitivamente por este caminho.
Sendo assim, a grande questão, diria a única questão, passa a ser: qual é a visão de longo prazo em que acreditamos? Que probabilidade atribuímos a um cenário de um consumidor e cidadão cada vez mais disponível para acompanhar (leia-se: para comprar e recomendar) empresas que genuinamente se preocupem com estes temas?
E se atribuirmos uma alta probabilidade a esse cenário futuro então tudo ganha claridade. Claridade que os grandes investidores já têm, que a gestão das grandes empresas já tem, e com isso arrastarão todo o ecossistema das pequenas e médias empresas que gravitam à sua volta.
Além das histórias de aparente êxito de empresas como Unilever, Patagonia, Lego (e tantas outras), creio que a maior evidência de que esta macrotendência veio para ficar está na famosa carta de Larry Fink (CEO da Black Rock), em janeiro de 2018, dirigida a todos os CEO das empresas que controla. Como dizem por Wall Street, há “um antes e um depois dessa carta”. Quando um personagem como este, CEO de uma empresa de 7 biliões de dólares, ou seja, algo como quase 40% do PIB dos EUA, se dirige a todos os seus “asset managers” colocando o foco no longo prazo, e que esse longo prazo só pode ser garantido através das métricas ESG (environmental, social and governance) então algo está de facto a mudar. O desempenho de curto prazo interessa pouco se não for consubstanciado na melhoria das métricas ESG — não sou eu que o digo, foi ele que o escreveu. E isso foi muito evidente ao longo de 2018, com o inicio de processos de revisão estratégica de um vasto número de empresas.
Fink acaba de enviar a sua carta para 2019 que vem confirmar e reforçar toda esta tendência (“only purpose leads to long term profit”) com que os grandes investidores se preocupam.
No futuro, a criação de valor só será sustentadamente conseguida quando os interesses de todos os stakeholders relevantes forem tidos em conta na definição da estratégia de empresa. A atual preocupação quase exclusiva com o interesse dos acionistas tenderá a esbater-se.
Estes novos desafios significam que os clientes (e stakeholders em geral) não estarão disponíveis simplesmente para comprar produtos e serviços, mas sim para comprar produtos e serviços sustentáveis (no sentido holístico do conceito).
Temos um sério problema de liderança política em todo o mundo (com poucas exceções), é difícil continuar a acreditar que governos e políticos serão capazes de inverter este trajeto e ritmo nefasto. Chegou a hora para os consumidores depositarem a confiança e esperança em líderes e empresas “responsáveis”. Estudos de mercado indicam uma tendência dos consumidores para comprar produtos e serviços de empresas que reconhecidamente estejam a fazer a diferença na sustentabilidade. E este círculo virtuoso irá capacitar cada vez mais essas empresas para impulsionar a agenda de sustentabilidade.
E termino parafraseando algo já ouvido algures: “Acredito que, se as empresas não se transformarem em empresas social e ambientalmente mais responsáveis porque é o melhor para o mundo em que vivemos, então devem fazê-lo porque é o melhor para os seus negócios."
Nuno Moreira da Cruz, Regente de Corporate Social Responsability e Globalization na CATÓLICA-LISBON.