As empresas familiares são a espinha dorsal da economia mundial e, por isso, têm merecido crescente atenção da investigação em gestão. No entanto, um aspeto muitas vezes subestimado é a influência persistente do fundador — um fenómeno que batizamos de “a sombra do fundador”. Sob a supervisão do Professor Pedro Neves, o meu projecto de doutoramento procurou explorar esta ideia em profundidade, através de três estudos complementares que demonstram como o legado de quem cria a empresa continua a moldar gerações futuras, muito para além da sua presença física.

Primeiro estudo – A persistência da sombra

Iniciámos com um estudo qualitativo com 25 empresas familiares portuguesas, que revelou que a influência do fundador não se limita às primeiras gerações. Pelo contrário, a sua sombra pode prolongar-se por várias décadas e até subsistir mesmo após a saída da família proprietária. Um dos resultados mais interessantes foi o papel ativo dos colaboradores na preservação desta presença, demonstrando que manter viva a memória do fundador não é apenas responsabilidade da família, mas também um movimento coletivo que reforça a identidade organizacional.

Segundo estudo – Medir o intangível

Para compreender melhor a natureza da sombra do fundador, desenvolvemos e validámos uma escala de medição. A partir de 154 potenciais indicadores, chegámos a uma escala final de 12 itens, organizados em quatro dimensões. Esta ferramenta abre caminho a novas linhas de investigação e oferece aos gestores familiares um instrumento prático para refletirem sobre o peso do legado na sua organização.

Terceiro estudo – Impactos no presente e no futuro

Finalmente, testámos esta escala em dois estudos quantitativos com 479 participantes, confirmando o seu valor preditivo. Os resultados demonstraram que a sombra do fundador está positivamente associada a atitudes e comportamentos fundamentais, como o orgulho organizacional, a criatividade, e até a intenção de ir embora da empresa por parte dos colaboradores.

Contributo global

Em conjunto, estes três estudos mostram que a sombra do fundador é um fenómeno complexo, mas de enorme relevância prática. Longe de ser um mito que se esbate com o tempo, pode ser um recurso estratégico para preservar a identidade, reforçar a coesão e inspirar inovação dentro das empresas familiares. Ao mesmo tempo, representa um desafio: líderes que não compreendem ou respeitam esse legado correm o risco de gerar resistência e perda de confiança entre os stakeholders.

Esta investigação contribui, assim, para a literatura de gestão e para a prática das empresas familiares, fornecendo um quadro conceptual e uma ferramenta de análise que ajudam a compreender como o passado continua a influenciar as decisões do presente e a preparar o futuro.

Liliana Dinis, Professora da CATÓLICA-LISBON