A primeira edição da Lisbon Sustainability Week (LSW), que decorreu de 16 a 18 de junho de 2025 na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, reuniu mais de 600 participantes e líderes internacionais para repensar o papel da ciência, da governação e das finanças na construção de uma economia mais verde, resiliente e justa.
Promovida pelo Center for Sustainable Finance da CATÓLICA-LISBON, com o apoio da Fundação Santander Portugal, a LSW posicionou Lisboa como capital europeia do debate sobre financiamento sustentável e transformação económica. O evento, que contou com a presença de figuras de destaque como Ernest Moniz, ex-Secretário da Energia dos EUA, e Sandrine Dixson-Declève, presidente honorária do Clube de Roma, combinou sessões académicas, workshops temáticos e mesas redondas, promovendo um diálogo interdisciplinar entre ciência, política, setor financeiro e empresarial.
Primeiro dia: ciência, pragmatismo e coligações estratégicas
A sessão de abertura ficou a cargo de Filipe Santos, Dean da CATÓLICA-LISBON, que apelou a uma resposta à crise climática ancorada na ciência e guiada pelo pragmatismo. “Temos hoje a tecnologia, os ativos e o conhecimento necessários para agir. Falta-nos a coragem para usar estas ferramentas ao serviço de um futuro comum mais próspero e sustentável”, afirmou. Para o Dean, a sustentabilidade não se impõe por decreto. Constrói-se com inteligência sistémica, compromisso coletivo e incentivos económicos bem desenhados. Defendeu ainda uma abordagem não ideológica, focada na aplicação de soluções já testadas, e sublinhou a responsabilidade individual e organizacional de passar da intenção à ação.
Este apelo encontrou eco na intervenção de Ernest Moniz, que defendeu uma transição energética realista, inclusiva e tecnicamente viável. No seu discurso, alertou para a ineficácia de metas ambiciosas sem planos concretos de execução, como o limite dos 1,5 °C, e propôs uma mudança de foco para estratégias exequíveis: “Está na hora de deixarmos de repetir objetivos inalcançáveis e começarmos a trabalhar em soluções exequíveis”.
O professor emérito do MIT apelou à formação de coligações amplas, incluindo os incumbentes da indústria energética, e defendeu uma abordagem integrada, em que clima, equidade social e segurança energética sejam tratadas como dimensões interdependentes.
A ideia de um pragmatismo informado esteve também presente na intervenção de Inês Gouveia, Presidente Executiva da Fundação Santander Portugal, que destacou a educação como motor da transformação sistémica: “Temos a evidência, temos o conhecimento. Agora é tempo de mudar”. Evocou ainda o conceito de cathedral thinking, a visão de trabalhar hoje por um futuro que só as próximas gerações vão habitar.
Durante a manhã, foram ainda realizadas apresentações de investigadores da Boston University, IESE, MIT e University of Southern California, centradas em riscos de transição e impacto regulatório. À tarde, investigadores da Harvard Business School, University of Maryland e University of Miami discutiram os efeitos das políticas climáticas e os compromissos do Acordo de Paris. Em paralelo, realizaram-se workshops sobre modelos climáticos (Pedro M. M. Soares, Univ. de Lisboa) e capital natural e biodiversidade (Nuno Gaspar de Oliveira, Natural Business Intelligence). O dia terminou com um painel moderado por Ana Albuquerque (Boston University), com Richard Sloan (USC) e Arne Staal (FTSE Russell).
Segundo dia: finanças climáticas e crítica ao modelo económico dominante
O segundo dia da conferência centrou-se nas finanças e nos mercados, com apresentações de nomes como Lucian A. Taylor (Wharton School), Neng Wang (Cheung Kong GSB) e Susana Campos Martins (UCP) sobre o impacto do carbono, risco climático e sustentabilidade no desenvolvimento económico. À tarde, o foco passou para remuneração executiva em contexto ESG e apoio dos acionistas, com contribuições de Mariassunta Giannetti, Kai Li e Per Strömberg.
A keynote speaker de encerramento do dia, Sandrine Dixson-Declève, apresentou um diagnóstico crítico do modelo económico dominante, defendendo que a transição justa não é um chavão, mas uma necessidade moral, económica e política. Lembrou que já foram ultrapassadas várias fronteiras planetárias, e que a atual crise é simultaneamente ambiental, social e política, exigindo reformas estruturais profundas, sobretudo no sistema financeiro.
Na sua intervenção, Dixson-Declève criticou a obsessão com o PIB como única medida de progresso e apelou a uma nova abordagem baseada no bem-estar, na equidade e na resiliência. Alertou ainda para os custos crescentes da inação, que poderão ultrapassar 10% do PIB global se o aquecimento médio global exceder os 2 °C: “A economia extrativa já bateu no muro. Precisamos de um sistema financeiro regenerativo que coloque as pessoas e o planeta no centro das decisões”.
Terceiro dia: da regulação à transformação dos modelos de negócio
O terceiro e último dia abordou a complexidade da operacionalização da transição climática num contexto de crescente polarização social e política. Representantes de instituições como a CMVM, Banco de Portugal, BRISA, EY, Deloitte, KPMG, CGD e Secil discutiram temas cruciais como regulação, financiamento da transição e transformação dos modelos de negócio.
O encerramento da conferência reforçou a ideia transversal: a resposta à crise climática não será eficaz se for apenas técnica ou idealista. É preciso colaboração pragmática, ferramentas concretas e lideranças corajosas, capazes de construir consensos com impacto real.