Em Portugal, como no resto do mundo, o setor dos transportes é a principal causa da poluição atmosférica urbana e o único setor na União Europeia cujas emissões de gases com efeito de estufa ultrapassam os níveis de 1990. Globalmente, os transportes representam 16% do total das emissões, mas em Portugal são responsáveis por 30% das emissões de gases com efeito de estufa. Dentro deste setor, o transporte rodoviário é o maior emissor, correspondendo a 72% das emissões de CO₂. A descarbonização do setor automóvel é, portanto, uma revolução necessária e em curso, na qual a mobilidade elétrica desempenha um papel crucial na redução das emissões, tanto a nível nacional como global.

O mercado dos veículos elétricos (VE) está a crescer rapidamente em Portugal. Novos modelos de negócio surgiram e os comportamentos de mobilidade evoluíram. O preço dos veículos elétricos diminuiu e a ansiedade dos consumidores em relação a esta tecnologia recente tem vindo a reduzir-se. As políticas públicas oferecem incentivos e ajustaram as regulamentações; a tributação dos veículos rodoviários passou a incentivar a compra de carros com menores emissões, com um foco crescente nos VE. Entretanto, a capacidade da rede de carregamento melhorou. No entanto, as emissões do transporte rodoviário em Portugal continuam elevadas, colocando em risco uma transição rápida. Este estudo analisa o estado atual da mobilidade elétrica em Portugal, os principais desafios enfrentados e como as políticas públicas podem acelerar a renovação da frota e alcançar as metas de descarbonização.

No PROSPER – Center of Economics for Prosperity, da Católica-Lisbon, realizámos um estudo sobre o estado e a evolução da mobilidade elétrica em Portugal. Constatámos que, apesar de progressos consideráveis — com cerca de 42.000 VE vendidos em 2023, um aumento de 92% face a 2022, e aproximadamente 130.000 veículos totalmente elétricos na frota nacional —, Portugal não cumprirá as suas metas de neutralidade carbónica até 2050, mesmo que todos os novos veículos vendidos a partir de agora sejam elétricos. Isto deve-se à lenta renovação da frota automóvel, cuja idade média é de 14 anos, sendo que 25% dos veículos têm mais de 20 anos. Ao ritmo atual, as emissões rodoviárias diminuiriam apenas 39%, muito aquém da meta de redução de 98%. Os veículos pesados enfrentam desafios ainda maiores: em 2023, apenas 5% das vendas de veículos pesados foram VE, sublinhando a necessidade urgente de expandir a infraestrutura de carregamento.

A utilização dos transportes públicos é reduzida, com apenas 14% da população a utilizá-los diariamente. Duplicar esta taxa para 28%, como na Alemanha, poderia reduzir as emissões do setor dos transportes até 12%. Além disso, os preços elevados dos VE representam uma barreira significativa; os veículos totalmente elétricos são, em média, 30% mais caros do que os veículos a combustão na Europa. Em Portugal, o preço médio dos dez VE mais baratos é de 30.000 €, superior ao da Holanda (25.000 €) e da Alemanha (24.000 €).

Outro problema são os custos elevados de utilização. Embora o carregamento doméstico seja 60% mais barato do que abastecer um carro a gasóleo, o carregamento público tem custos equivalentes aos dos veículos a combustão (gasóleo). Além disso, 42% dos agregados familiares não têm acesso a estacionamento, impossibilitando o carregamento doméstico. A estrutura complexa do mercado de carregamento e a falta de transparência nos preços dificultam ainda mais a situação. Três grandes operadores controlam a maioria das estações de carregamento (57%), e em 32% dos municípios existe apenas um operador. Esta concentração indica a necessidade de permitir que os operadores de carregamento vendam eletricidade diretamente aos utilizadores. A revisão do modelo organizacional do setor poderia aumentar a concorrência, expandir a rede de carregamento e reduzir os preços. Garantir transparência nos preços e permitir pagamentos com cartão bancário em todas as estações de carregamento melhoraria a experiência dos utilizadores.

A infraestrutura para carregadores rápidos e ultrarrápidos é insuficiente. Embora o número de carregadores tenha aumentado 5,6 vezes desde 2016, o número de VE cresceu 34,5 vezes no mesmo período. Existem 231 municípios sem estações públicas de carregamento rápido ou ultrarrápido. Há disparidades regionais, com áreas de tráfego intenso sem infraestrutura adequada. Em média, há 77 utilizadores por ponto de carregamento rápido em Portugal, mais do que o dobro da média da UE, e 712 utilizadores por ponto de carregamento ultrarrápido. A distribuição dos carregadores segue a densidade populacional, concentrando-se em Lisboa e no Porto, mas deixando outras zonas de elevado tráfego desprovidas de infraestrutura suficiente.

O nosso estudo conclui que são necessárias mais medidas políticas para atingir as metas de redução de emissões. Aumentar os apoios à compra de VE aquando da substituição de veículos antigos e poluentes é essencial. Facilitar a utilização de VE através de incentivos como vias prioritárias, subsídios nas portagens e benefícios no estacionamento pode incentivar a adoção. Rever a estrutura do setor para aumentar a concorrência pode expandir a disponibilidade de postos de carregamento e reduzir os preços. Assegurar transparência nos preços e permitir pagamentos com cartão bancário nos postos de carregamento tornará a experiência mais conveniente para os utilizadores. Priorizar a instalação de carregadores rápidos e ultrarrápidos, especialmente para viagens de longa distância, é fundamental. Promover o acesso a transportes públicos de qualidade oferece uma alternativa sustentável ao uso do veículo individual.

Tenha uma ótima semana, cheia de impacto!

Joana Silva
Professora na CATÓLICA-LISBON