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Dívida externa bruta e líquida

Autor: João Luís César das Neves

Quando entrámos na moeda única em 1999 a dívida bruta já ia em 122% do produto e a líquida em 32%; no pico da crise elas eram 260% e 124% respetivamente; hoje, após anos de recuperação, a bruta está em 215%, bastante mais do dobro do que produzimos, e líquida iguala o nosso produto, 104%.

Gráfico 1. Dívida externa bruta de Portugal, total e pública, em percentagem do produto interno (Descarregar ficheiro Excel)
Fonte: Banco de Portugal.

Um dos grandes problemas que a economia portuguesa apresenta, ao enfrentar a epidemia de gripe é, sem dúvida a sua frágil posição financeira. Este facto pode surpreender alguns, porque nos tem sido assegurado que, desde que a troika se foi embora em 2014, as coisas vão pelo melhor. A verdade é que, embora a conjuntura favorável dos últimos seis anos nos tenha melhorado a situação, ainda nos encontramos muito dependentes do exterior.

O primeiro gráfico mostra a evolução da dívida externa bruta de Portugal, tudo aquilo que os portugueses –Estado, famílias e empresas– devem ao estrangeiro; a parte que compete ao Estado está assinalada em baixo. Estes valores dizem-se brutos porque, felizmente, os estrangeiros também nos deve alguma coisa; eliminar essa fatia é considerar a dívida líquida, o que está no segundo gráfico.

Gráfico 2. Posição de investimento internacional (dívida externa líquida, em percentagem do produto interno). (Descarregar ficheiro Excel)
Fonte: Banco de Portugal.

A primeira coisa que se nota é que três quartos da nossa dívida externa bruta é do sector privado. Apesar de toda a atenção que se dá à dívida pública, que realmente é muito grande, ela não constitui a maior fatia do nosso endividamento.

O segundo elemento que ressalta do gráfico é a impressionante evolução, aliás paralela em ambos. Em 1992, data em que assinámos o Tratado de Maastricht e entrámos no caminho para o euro, a nossa dívida externa bruta era 28% do nosso produto, pouco mais de um quarto do que produzimos, 8% em termos líquidos. Quando entrámos na moeda única em 1999 a dívida bruta já ia em 122% do produto e a líquida em 32%; no pico da crise elas eram 260% e 124% respetivamente; hoje, após anos de recuperação, a bruta está em 215%, bastante mais do dobro do que produzimos, e líquida iguala o nosso produto, 104%.

Isto mostra bem a dimensão da euforia de endividamento que a participação no projeto monetário nos trouxe. O uso da mesma moeda dos nossos parceiros significou uma enorme descida das taxas de juro, o que deslumbrou os nossos políticos mas, sobretudo, os nossos cidadãos.

A correção realizada nos últimos anos é significativa, mas está longe de tornar sustentável a nossa situação. Enfrentamos este vírus, como enfrentaremos as próximas décadas, arrastando uma enorme dívida acumulada nos anos de euforia.

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