We are Missing the Opportunity of the Century!

CATÓLICA-LISBON
Tuesday, May 2, 2023 - 12:45

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O meu argumento neste artigo é simples – o Governo tem ao longo desta legislatura até 2026 uma oportunidade extraordinária e irrepetível de colocar a dívida pública num patamar de sustentabilidade perto dos 80% do PIB, valor anterior à crise financeira de 2008 sem obrigar os Portugueses a grandes sacrifícios como foi no tempo da Troika. Até ao terceiro trimestre de 2022 o Governo fez as escolhas certas para esta estratégia, embora não o anunciasse. Subitamente, a partir de final de 2022, arrepiou caminho e tem vindo a desbaratar esta oportunidade, comprometendo o país e a prosperidade das gerações presentes e futuras. Ainda vamos a tempo.

É que em cada crise há oportunidades. O aparecimento súbito de inflação em 2022 e a consequente agressiva subida das taxas de juro pelos bancos centrais nas economias mais desenvolvidas gerou instabilidade no setor financeiro, com falências de bancos, e gerou dificuldades para as famílias que perderam poder de compra, mas também gerou oportunidades. E, ironicamente, ninguém beneficia mais no curto e médio prazo desta situação que os Estados mais endividados como o português. E os benefícios vêm de múltiplas frentes, todas convergindo para a melhoria das contas públicas.

Do lado das receitas, devido à inflação, as receitas de IVA começaram a aumentar a dois dígitos e as receitas de IRC/IRC seguiram a mesma tendência após alguns meses, bem como as contribuições para a segurança social. Hoje sabe-se que em 2022 o Estado cobrou mais 14.9% de receita fiscal que o ano anterior, atingindo o valor recorde de 36.4% do PIB, isto sem aumento das taxas de imposto.

Do lado da despesa, os custos regulares do Estado estão fixados em orçamento e não se alteram muito no curto prazo. Durante a maior parte de 2022, o Governo fez uma gestão orçamental prudente, contendo aumentos de salários públicos, pensões e gastos, para evitar alimentar uma espiral inflacionista. Ao mesmo tempo lançou programas temporários de apoio às famílias, pensionistas e empresas, em particular nos segmentos mais necessitados da população ou indústrias mais afetadas pelos custos energéticos, de forma a ajudar quem mais necessitava, mas sem aumentar de forma permanente a despesa do Estado.

Com esta evolução de receitas e despesas, o Governo estava em condições de apresentar um equilíbrio orçamental pela segunda vez em 50 anos de democracia, seguindo o bom exemplo do ano de 2019. E o rácio da dívida no PIB, que atingiu o seu máximo em 2020 com 134.9%, podia cair em pouco anos para um valor abaixo dos 90%. É que a capacidade de pagar a dívida pública depende da dimensão da economia. Com a recuperação económica pós-pandemia e o aumento do PIB nominal devido à inflação, o montante bruto de dívida pública consegue reduzir-se em relação ao PIB de forma acelerada se houver equilíbrio orçamental. Em 2021 o endividamento caiu para 125.4% do PIB e em 2022 desceu para 113.8% - uma descida de 21.1% sem nenhum corte nominal de rendimentos nem aumento de taxas de impostos.

Mas então o aumento dos juros não prejudica o Estado? Sim, mas essencialmente no médio e longo prazo pois no curto prazo a maior parte da dívida existente paga um juro fixo e só a nova dívida emitida é que pagará taxas mais elevadas. Em 2022 o Estado pagou a menor taxa de juro média sobre o stock de dívida de sempre em 1.8%, tendo vindo a descer todos os anos desde 2012 quando era de 3.9%. É verdade que a nova dívida está a pagar um juro de perto de 4%, mas com equilíbrio orçamental, a necessidade de emissão de dívida é menor e o enorme aumento de subscrição de certificados de aforro pelos Portugueses (média mensal de 3 mil milhões de euros em 2023) tem sido uma importante fonte de financiamento do Estado, ao ponto do IGCP cancelar emissões de nova dívida.

E não é mau o Estado estar a pagar 3.5% de juro pelos certificados de aforro? Pelo contrário, é bom. O estado retém em IRS imediatamente 28% desse valor. E esses juros são rendimentos extra das famílias o que aumenta o PIB nacional, ao contrário da colocação de dívida nos mercados internacionais. Ao mesmo tempo, são uma fonte de financiamento com inércia e bastante fidelidade, ao contrário dos voláteis mercados.

Portanto, aquilo que é uma tempestade perfeita para a Economia tem sido a bonança perfeita para a gestão da dívida pública e para a sustentabilidade da segurança social. E o elevado montante de fundos Europeus que Portugal vai receber nos próximos dois anos, de longe o maior bolo de sempre, vai ajudar ainda mais a gerar receitas e a crescer a Economia, sem ser necessários estímulos extra que seriam inflacionários.

O Governo tem assim uma oportunidade única de transformar o círculo vicioso da dívida pública em ciclo virtuoso. A menor taxa de juro média da dívida de sempre, as maiores receitas de sempre, custos controlados que não alimentam inflação, aumento da dívida nas mãos dos portugueses, redução da perceção de risco da dívida portuguesa nos mercados o que reduz os juros futuros e, até, capacidade de amortizar dívida que seja mais cara (como aquela emitida no tempo da Troika) ou que esteja no mercado a desconto. Tudo isso permitindo uma acelerada redução da dívida sobre o PIB, libertando de vez o país deste enorme encargo que pesa sobre as gerações presentes e futuras.

Infelizmente que, desde final de 2022, o Governo arrepiou caminho e não teve coragem de fazer aquilo que deve ser feito. Gastou dinheiro apressadamente no final do ano para não apresentar um excedente orçamental, ficando com um déficit de 0.4% do PIB. Anunciou em 2023 aumentos generalizados para a função pública e subsídios generalizados com a redução do IVA, numa altura em que a inflação começava a abrandar. Foi generoso com a atualização das pensões criando compromissos permanentes e passou a mensagem que começou a dar dinheiro, suscitando uma dinâmica reivindicativa que quem faz mais greves e protestos receberá mais benesses. O programa de estabilidade 2023-2027 apresentado em abril só prevê um excedente orçamental em 2027 (quando teremos um novo governo!), ignorando o facto do momento mais propício para ter excedentes orçamentais ser o período de 2022-2024. Em vez do plano de chegar a 92% de rácio da dívida em 2027 poderíamos e deveríamos chegar a menos de 90% em 2025.

O aumento sustentável dos salários privados e públicos e a capacidade de pagar pensões nunca virá das benesses do Governo ou das folgas conjunturais. Virá da competitividade da Economia e das empresas que gerará crescimento e riqueza e criará folgas estruturais, essas sim que podem ser investidas e distribuídas.

Há quem diga que a dívida excessiva não é para se pagar. Sejamos claros – uma família demasiado endividada não tem liberdade. Uma empresa demasiado endividada não tem viabilidade, um país demasiado endividado não tem soberania. A dívida excessiva impede o investimento num futuro melhor. Façamos todos um compromisso nacional de, com algum sacrifício durante 2-3 anos, permitirmos a Portugal ter soberania e construir um melhor futuro. E façamos da “disciplina das contas certas”, não uma ofensa política, mas sim um desígnio nacional, neste período favorável de benesse orçamental que não se repetirá.

PS: É um prazer anunciar que a CATÓLICA-LISBON recebeu a semana passada a boa notícia da renovação da sua acreditação pela AACSB por um novo período de 5 anos. Fomos a primeira Escola de Negócios em Portugal a ter a acreditação Triple Crown desde 2007 e continuamos a apostar na internacionalização e na atração de talento global de excelência entre professores e alunos. Quando as empresas e universidades se viram para o mercado internacional e se sujeitam aos standards de qualidade mais rigorosos, recebem novas ideias, estímulos e exigências que obrigam a fazer mais e melhor, melhorando a competitividade. Hoje a CATÓLICA-LISBON está no TOP 30 na Europa e no 1% melhor do mundo, sendo reconhecida pelos avaliadores como tendo a melhor investigação em Portugal e o ensino mais rigoroso, com os alunos mais dedicados.

Filipe Santos, Dean da CATÓLICA-LISBON